Foto : Nelson Vitorino e o meu filho Tomás na Volta ao Algarve 2009
Agora que acabou a Volta a Portugal, é tempo de homenagear aqui no "O meu espaço" um amigo...um ciclista que finalizou a Volta no Top 10 da geral individual. O Vitorino têm tanto de bom ciclista como de Homem. É uma amizade que ficou desde os tempos em que fui corredor de bicicleta. Ele prosseguiu a carreira, e agora é um dos mais respeitados ciclistas Portugueses. Para alem de outros lugares de destaque noutras provas realizadas esta época e nas anteriores, consegue terminar esta Volta a Portugal num excelente 8º lugar. Mais importante este resultado, se ter em conta que tinha como missão ajudar o seu colega e dorsal 1 David Blanco. E não se ficou por este trabalho...foi vê-lo tambem na ajuda ao Candido Barbosa no inicio da Volta, até à 1ª chegada em alto (Monte Sta. Quitéria em Felgueiras), altura em que o Candido mostrou não estar em condições de discutir a geral individual da Volta a Portugal.
Apesar da distancia (kilométrica) que nos separa a amizade perdurou sempre, e há sempre histórias, algumas recambolescas para contar dos tempos em que fomos colegas de equipa, ou adversários na estrada (no meu 1º ano de junior no C.C. Loule e o Vitorino no C.C. Tavira).
A história que vou aqui registar passou-se em 1995, o meu ultimo ano no ciclismo. A equipa foi convidada para participar na "Vuelta Ciclista a Espana Aficionados"era a Volta a Espanha para o nosso escalão na altura designado por Amadores, agora Sub-23.
Mês de Julho, a prova iniciava-se em Valladolid com um prólogo. No dia seguinte, 1ª etapa com partida de Valladolid e chegada a Salamanca. Foi um dos piores dias da minha curta carreira, senão o pior. Estava algum vento nesse dia, e muito calor...mesmo muito...a etapa não me recordo com exatidão os kilometros, mas seriam à volta de 140 talvez...tenho o livro oficial guardado em casa, preciso recordar isso.
Ainda na 1º hora de corrida há um ataque de um dos principais favoritos, era ele Klaus Moller, que viria mais tarde a vencer a Volta a Portugal. As equipas mais fortes organizam-se na frente...e foi à morte como se costuma dizer...
Pelotão encostado à berma da estrada, com vento lateral e está bom de ver como aquilo foi...eu não ia bem colocado e com uma queda logo à minha frente, acabou ali por partir...nunca mais recolei ao pelotão...o carro de apoio deixou-me 2 bidons e foi embora...faltava metade da etapa ainda...
Apanhei alguns ciclistas, pela estrada, mas iam acabando por desistir, deixando-me quase sempre sozinho. Rapidamente fiquei sem agua. Pedi a um camionista que estava parado na berma da estrada por ordem dos batedores do trânsito...disse-me que não tinha. Lembro-me disto como se fosse ontem...
Passado alguns kilómetros avisto uma estação de serviço, onde estavam alguns corredores ali parados a molharem-se com a mangueira da agua sobre si! Olha o Vitorino tambem ali está!
Acabei por fazer o mesmo! Depois fizemo-nos à estrada. Devo dizer, que todos os outros acabaram por desistir, uns logo ali e outros mais adiante indo para o carro vassoura. Só eu e o Nelson Vitorino prosseguimos. Só por muita insistência do Vitorino, fui ate ao fim com ele...eu não conseguia estar em cima da bicicleta e sabia que o atraso era grande...
Chegamos à meta com 39 minutos de atraso, fora de controlo...era previsivel.
Estavam em Salamanca 47º !!!! Foi um inferno!
Passaram catorze anos e continuo com a imagem do placard da cidade com as horas do dia e da temperatura no meu cérebro...
Lembro-me que nesse 1º dia desistiram vinte e tal corredores...e o dinamarquês Klaus Moller não chegou a ser apanhado, mesmo com toda aquela perseguição tendo ganho essa etapa... e a Vuelta no final tambem foi para ele!
No dia seguinte um director da equipa veio nos trazer à fronteira de Vilar Formoso para apanharmos o comboio e vir para casa. Deu-nos 5.000$...para nós dois fazermos a viagem até ao algarve e comermos...
Apanhamos o comboio ate Coimbra. Mudamos para outro que nos traria até Lisboa. Atravessamos no barco o rio Tejo e chegamos ao Barreiro. O ultimo comboio para o Algarve já tinha partido. Era tarde, muito tarde penso que por volta da meia-noite. Onde dormimos? Num banquinho de madeira qualquer que por ali havia. Só no dia seguinte tinhamos comboio para vir para o algarve.
No dia seguinte apanhamos o comboio, o 1º da manhã e viemos para Portimão os dois. Ficamos em minha casa, a recuperar deste "filme" 2/3 dias e depois o Vitorino foi para sua casa em Olhão.
Foi talvez o momento mais negativo que passei no ciclismo...ainda hoje quando nos encontramos, recordamos o dia em que paramos numa estação de serviço espanhola em plena corrida para nos molharmos... parecia o deserto, e no dia seguinte..."tomem lá 5 contos e vão para casa...desenrasquem-se!"
Esta história ficou gravada no meu cérebro de tal forma que ainda hoje consigo contar as coisas que se passaram com tanta exactidão!
Um grande abraço Vitorino!